FÁBULAS ALUCINADAS

O homem que queria um Nobel

Dia desses Amadeu(*) acordou com uma vontade desesperada de ganhar um prêmio Nobel. Assim, bem simples.

Podia ser um de física, talvez química, quem sabe literatura, e até (e por que não?) de medicina! "Afinal, as doenças estão aí para serem curadas!" - pensava ele. Mas a verdade é que Amadeu se contentava até com um Nobelzinho de economia, daqueles que todos esqueceriam mais tarde.

E deste modo, com uma disposição hercúlea para o trabalho, acordou com o pé esquerdo(*) e se pôs a encontrar um assunto no qual pudesse se envolver completamente. Começou pensando em desenvolver uma teoriazinha bem básica, uma que unificasse todas as teorias físicas existentes, uma "teoria da unificação universal".

"Acho que esse trabalho vai me consumir algumas horas" - pensou Amadeu - "Mas como eu não tenho muita coisa pra fazer nessa semana, e como sete dias bem trabalhados podem render um mundo, vou começar agora".

Ao final do quarto dia ele já estava conseguindo se lembrar direitinho como é que se faziam as quatro operações. Ficou-lhe evidente que aquilo não seria o bastante para descobrir os segredos do universo. Resolveu então abandonar suas teorias físicas revolucionárias e partir para algo mais palpável. Debruçou-se violentamente sobre o estudo da biologia, e tamanha foi a violência de seu debruçamento que acabou pegando no sono quase instantaneamente.

Tornou-se óbvio que descobrir uma vacina que acabasse com todas as doenças não seria uma tarefa para alguns dias. "Provavelmente eu gastarei semanas" - pensou.

Amadeu trabalhou por algumas horas e terminou convencido que se tivesse conseguido decifrar aquele livro de biologia da sexta série nada o teria impedido de ir a cabo com seu desígnio.

Resolveu, depois de muito pensar por uns dois ou três segundos, que ganharia um prêmio Nobel de literatura. Rapou sua caderneta de poupança e comprou o computador mais rápido que encontrou na loja de informática. Amadeu não queria que nada, nem aquele computador velhíssimo de dois anos que ele costumava usar, atrapalhasse o processo criativo de seu primeiro best-seller. Processo criativo que ele nem mesmo sabia o que significava e best-seller que ele não fazia a menor idéia de como começar, já que não gostava de ler, pois achava que "esses livros tem muitas letrinhas que a gente tem que ler para conseguir entender o livro que é cheio de letrinhas e sem figurinhas pra gente ver e ajudar a entender as letrinhas que a gente tem que ler pra entender esse livro sem figurinhas pra gente ver e pra não doer a cabeça".

Dez minutos e muitas folhas amassadas depois, convenceu-se de que não estava inspirado e resolveu partir para algo mais concreto. Resolveu ganhar o Nobel de economia, e começaria ganhando dinheiro na bolsa de valores. "Primeiro vou sentir o feeling do negócio pra dar aquele plus a mais e ficar podre de rico!" - raciocinava. Desistiu quando viu que não tinha nem um tostão no bolso e que estava devendo três meses no açougue.

Já estava perdendo as esperanças, mas decidiu tentar um Nobel em química. "Quem sabe eu não invento uma Coca-Cola melhorada ou um novo tipo de eliminador de mau hálito?" - perguntava-se. E pôs em prática sua empreitada num galpão nos fundos de sua casa. Pegou todos os produtos químicos que encontrou pela frente e iniciou seu alquímico experimento:

"Duas pitadas de noz-moscada, meio litro de alcatrão, Ajax, tempero pra pizza...deixe-me ver... sal-amoníaco, farinha Láctea, fermento, duas colheres de nitrato de potássio, acetato de vinilo? Ah, vai também...Cânfora, terebintina, permanganato de potássio, mercúrio cromo...e...que mais...hã....um pouco disso, um pouco daquilo, mais um pedaço disso aqui e Voilà! Acho que está pronto!"

Amadeu bateu tudo no liquidificador e bebeu seu precioso caldo sonhando com as glórias que viriam. Quando acordou estava na UTI  se recuperando de uma intoxicação quase fatal e de queimaduras em todo o aparelho digestivo.

Algumas semanas depois, após convencer os médicos e as autoridades de que não se tratara de uma tentativa de suicídio, Amadeu recebeu alta.

Hoje Amadeu nem pensa mais nessa história de prêmio Nobel e de reconhecimento da comunidade científica. Sua nova meta é entrar para o Guinness como o ser humano que ficou mais tempo na frente de um aparelho de televisão, bebendo cerveja e sem tomar banho.

Dizem que ele anda muito desanimado com a concorrência.



(*) O nome do personágem foi inspirado no marido da irmã de minha mãe... ou seja, minha Tia!

(*) Ele realmente gostaria de ter acordado com o pé direito, mas sua cama tem o lado direito encostado na parede. Dessa forma, a única maneira dele acordar com o pé direito é fazendo um buraco no referido obstáculo e completar seu perfeito despertar no quarto do vizinho.



Moral: A maioria prefere parar num "Nobilis" a tentar um Nobel.

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