FÁBULAS ALUCINADAS


Terezinha e os Bolinhos de Queijo

Terezinha adorava bolinhos de queijo. Não somente adorava, como não sabia viver sem eles.
Terezinha passava o dia a contar as horas aguardando a chegada do fornecedor dos bolinhos de queijo "Legítimo" no mercado perto de sua casa. Existiam outras marcas, mas nenhuma fazia um bolinho de queijo como a Legítimo fazia, e Terezinha preferiria cair morta por um raio e ser devorada por cães famintos a comer os bolinhos de outro fabricante.
- Eu quero os bolinhos da Legítimo e de mais ninguém! - gritava quando alguém tentava empurrar-lhe outra marca.

Todos os seus amigos e colegas diziam para Terezinha que ela estava exagerando e que aquilo já havia virado uma doença. Mas era tudo em vão. A cada acusação, Terezinha respondia:
- Eu adoro bolinhos de queijo e se eu morresse hoje em cima de uma pilha de bolinhos de queijo, eu morreria feliz.

E, como um relógio suíço, todo o santo dia Terezinha saía de sua casa ao mesmo horário para comprar seus bolinhos.

Certo dia, Terezinha foi ao mercado como de costume, e como de costume pediu os bolinhos de queijo. Para seu mais profundo terror, ouviu:
- Hoje o fornecedor não virá. Só amanhã.

Sentiu como se um tijolo maciço tivesse acertado-lhe a testa. Aquilo jamais havia acontecido antes.
- Só amanhã? Só amanhã? Como irei sobreviver? - desesperou-se Terezinha.

A musculatura endurecida pelo choque e os calafrios que corriam por sua espinha quase não a permitiam andar. Suava de ansiedade e não mais havia unhas a roer em seus dedos.

Bem que seus amigos disseram que um dia isso poderia acontecer, mas ela nunca lhes deu ouvidos.
Aquelas se tornariam as vinte e quatro horas mais longas de sua vida. A angústia lhe parecia insuportável.
- E se eles não vierem amanhã também? - torturava-se Terezinha.

Os segundos se arrastavam e com eles levavam o pouco que ainda sobrava de sua sanidade. Terezinha já não distinguia as coisas corretamente. Começava a ter alucinações. Via bolinhos de queijo pela casa toda, e quando, desesperada, tentava mordê-los, acabava sempre com um pé de cadeira ou um cinzeiro entre os dentes.

A cada barulho de caminhão que ouvia, corria enlouquecidamente para a janela rezando para ver aquelas quatro sílabas estampadas no veículo: Le-gí-ti-mo. E por inúmeras vezes fez isso.

Quando enfim chegou o outro dia, Terezinha encontrava-se transformada em um bagaço humano. Ninguém a reconheceria por detrás daquelas olheiras e daqueles cabelos desgrenhados. Sua dependência por bolinhos de queijo havia tornado-se tão profunda e sua necessidade imediata por cravar os dentes em alguns deles tão forte que Terezinha já não raciocinava mais, tampouco dizia coisa com coisa. Saíam somente grunhidos de sua boca e, entre um ranger de dentes e outro, podia-se ouvir: "BO...runagagbn...LI...grauunnhannram...NHO". Era uma cena realmente horrível.

Mas então, para alívio de seus amigos e parentes, o caminhão da Legítimo chegava e trazia consigo a preciosa cura para os males de Terezinha, ao menos para aquele dia. Ao ouvir o inconfundível som, Terezinha saltou de sua cama, driblou aqueles que tentaram segurá-la e saiu enlouquecidamente rua a fora. Derrubou as pessoas que passavam na calçada e atirou-se no meio do trânsito. Jogou seu psicótico corpo em cima do caminhão e abriu uma bocarra como se desejasse devorar o veículo.

O motorista, apavorado, girou rapidamente a direção para a esquerda na tentativa de desviar da maníaca criatura. Mas a sorte de Terezinha já estava selada. O caminhão tombou e bateu com sua carroceria em Terezinha, que foi arremessada às alturas como se fosse uma bola de vôlei em um saque jornada nas estrelas.

Enquanto Terezinha voava pelos ares como uma boneca de pano, o caminhão da Legítimo capotava e liberava sua carga pelo asfalto, formando um enorme monte. E, em cima daquele monte de bolinhos de queijo, Terezinha tombou.

Todos os que por ali passavam tentaram ajudá-la, mas não havia nada o que fazer.
E naquela hora, em cima daquela pilha de bolinhos de queijo, Terezinha esboçou um sutil sorriso e morreu, segundo suas próprias palavras, feliz

1 comentário

Magna Eugênia em 9 de agosto de 2011 às 23:52

Se não fosse trágico seria cômico. Ah, dane-se, não conheço Terezinha, essa história é pura crônica, cômico é pouco pra descrever! Parabéns pela arte, eu sou sua fã, quero um autógrafo! =D

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